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O Legado de Yangchen: União

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Pelo menos Nujian estava espetacular, como sempre. Um dia de brincadeiras na selva lado de fora de Taku tinha rejuvenescido o bisão do Avatar. Ele veio até eles pulando sob o prado, desfrutando do contato de suas seis patas na terra. A gramas balançou com o impacto.

 

— Não faz barulho! — Yangchen falou para ele. Ela usava uma roupa de quem mora em cidade cinza para a missão e envolveu sua cabeça com um lenço. — Você vai chamar atenção.

 

Nujian bufou, diminuiu seu trote e mexeu sua lã ondulada, com folhas caídas que se entrelaçavam em seu pêlo como enfeites de um pintor de paisagens. Apesar da bronca, a primeira coisa que ele fez quando chegou perto deles foi aninhar-se em sua Dobradora do Ar. Yangchen apoiou-se ao toque, fechando os olhos.

 

Kavik conseguia sentir a força que eles extraíam um do outro. Yangchen quase não tocava nas rédeas de Nujian e geralmente falava dele como se fosse um irmão e não um corcel amado. Deve ser bom poder confiar em alguém completamente. 

 

Neste exato momento, um bisão do ar diferente usava a sela de Yangchen e descansava no estábulo de Taku, paparicado por cuidadores e manuseadores que provavelmente recebiam salário dos zongdus. A troca foi preparada com antecedência caso eles precisassem sair de Taku sem ninguém saber. Nujian sequer entrou na cidade.

 

Eles estavam tão envolvidos em trapaças que até o bisão do Avatar tinha um dublê.

 

Pelo menos Kavik poderia aproveitar um tempo de qualidade com um dos melhores membros do time, alguém que sabia que um rancor não dura para sempre. Ele estendeu os braços quando Nujian se aproximou.

 

— Aww, aqui está meu grande felpudo— Ei! Ei! isso é trapaça!

 

Usando seu talento inato de produzir objetos escondidos do nada, Jujinta levantou uma maçã que claramente não fazia parte dos suprimentos. Nujian virou para longe de Kavik e se aconchegou no subornador asqueroso, roncando até conseguir sua recompensa.

 

A expressão nos olhos de Jujinta enquanto ele coçava as orelhas do bisão eram mais frias do que o dentro de uma serra de gelo. Isso mesmo, seu olhar morto e sem alma dizia a Kavik. Vou tirar tudo de você.

 

—Vai, continue desperdiçando nosso tempo valioso. — Yangchen disse. Ela já havia subido na cernelha de Nujian. — Lembre-se que eu posso fazê-lo morder vocês dois com uma só palavra.

 

Isso acabou com a confrontação. Kavik e Jujinta subiram na sela sem falar nada. Algumas ameaças eram terríveis demais para ignorar.

 


 

Kavik admitia que entendia a obsessão de Iwashi com barcos nessa época do ano. O clima estava absolutamente deslumbrante. Caso ele tivesse os meios parecidos com o de Zongdu de Taku, ele também escolheria seus dias parado nessas águas.

 

A umidade sufocante da costa tinha passado, trocada por uma briza calorosa e flexível. O oceano rolava e espumava abaixo deles, uma camada de confecção se espalhava até onde os olhos conseguiam enxergar. A única coisa que estragava o voo era a companhia.

 

— Você pode parar com isso? — Kavik falou enquanto Jujinta lenta e inquietantemente girava sua cabeça para frente e para trás sob a beira da sela. Yangchen atribuiu uma direção diferente para cada um monitorar. — Olhar para o mesmo trecho de mar aberto mais de uma vez é inútil. Se você não viu da primeira vez, você não vai ver se olhar de novo. 

 

— Você procura do seu jeito e eu procuro do meu. — Jujinta falou. Ele fez outro giro, tomando o cuidado deliberado de piscar em intervalos regulares. — Além do mais, só um tolo confia no seu primeiro olhar. O brilho do sol, um grande inchaço bloqueando uma parte do horizonte. Você provavelmente deixou nosso objetivo passar com sua falta de cuidado.

 

Kavik revirou os olhos e recostou-se. Ele prendeu seu pé contra a sela. Uma vez, mais uma vez. Finalmente, ele fez uma carranca e se virou para olhar atrás deles. Não havia nada, é claro.

 

Ele estava cético desse plano desde o começo. Retirar conclusões sobre a existência e o local de uma base secreta tirada de lacunas em registros parecia inconsistente para ele. Ele preferia confirmações positivas, evidências diretas. Talvez ele estaria mais convencido se Yangchen tivesse deixado ele ler as anotações roubadas, mas ela com certeza não revelaria mais informações para o Lótus Branco, além do necessário.

 

— Você pode nos colocar mais perto da água? — Jujinta perguntou a ela. — Bem perto?

 

Yangchen estalou seus dentes e Nujian virou bruscamente para o lado. Kavik teve de segurar na amurada atrás dele para não deslizar através da sela. Jujinta se inclinou para baixo enquanto eles desciam, alcançando a superfície da água, até que eles ficaram perto o suficiente para ele passar seus dedos pelas ondas.

 

— Alguma coisa? — Yangchen gritou sob o barulho.

 

— Não. — Jujinta tirou seu braço e balançou-o para tirar a água salgada.  — Pensei que poderia tentar.

 

Nujian nivelou sua rota de voo e subiu. Kavik contemplou o que acabou de ver. Eles deveriam ter levado Tayagum se para ler as correntes, ele era o marinheiro mais experiente.

 

— Você sabe achar caminhos?

 

— Não muito bem. — Jujinta falou. — Você não precisa parecer tão surpreso. Eu nasci em uma ilha. Tenho tanta afinidade com— Ele se cortou antes de terminar.

 

— Ha! — Kavik disse. — Você ia dizer que tem tanta afinidade com a água como eu, antes de perceber o quão estúpido ia soar. Ainda bem que não colocamos você perto de Iwashi. Ele teria ficado entediado com você. — Ele se acomodou em seu lugar e esperou por uma resposta.

 

— Eu não sou o melhor com conversas. — Jujinta disse discretamente. — Não tenho a língua rápida como vocês.

 

Ele se retraiu dentro de si mesmo, seus lábios pressionados firmemente um contra o outro. Sua postura, tensa ao ponto de quase tremer, lembrou a Kavik de como ele se portava antes do seu trabalho em Jonduri, quando os outros membros da associação zombavam e torciam contra ele na competição de jogar facas. Ele até se esqueceu de rastrear o horizonte de um lado para o outro.

 

Kavik notou Yangchen encarando-o  furiosamente. Ele não podia discutir com seu antigo parceiro do mesmo jeito que fazia com o Avatar. A ameaça de morte aparentemente era jogo limpo, mas fazer graça não. Eles não pedem que Jujinta encene da mesma forma que não designam Kavik a nocautear um inimigo à distância.

 

Ele suspirou.

 

— Sabe, mesmo em Jonduri, não lembro de você mencionar onde cresceu.

 

— Eu não falei. — Jujinta falou grosseiramente. — Meu povo não revela segredos a nenhum estranho.

 

— Agora não somos mais estranhos. Você já sabe o meu pior segredo e é educado ser recíproco. Vamos lá. Fale.

 

Todo mundo se imagina como uma fortaleza. Mas existia uma lição que Kavik aprendeu com suas conversas com alvos, que uma retirada atrás das paredes geralmente era um pedido de ajuda. Aparentemente, Yangchen concordava, porque ela soltou as rédeas para se juntar a eles na parte de trás.

 

Ela colocou seus pés na posição lótus.

 

— Compartilhar histórias com pessoas que se importam com você pode aliviar os fardos que carregamos. Um segredo revelado é como uma pedra nos ombros sendo jogada no mar.

 

Jujinta os observou cautelosamente, sem certeza de como lidar com uma abordagem de interesse amigável. Sua mandíbula tremeu, uma série de falsos começos que pareciam se desenvolver numa fala.

 

Mas os ventos mudaram. Jujinta se fechou como a boca de uma amêijoa, braços cruzados sob seu peito. 

 

— Não tem nenhum motivo para eu falar sobre minha casa. — Ele respondeu. — Porque nunca mais posso voltar lá.

 

Kavik bufou.

 

Nunca é um pouco exagerado, não acha? Se você tem algum problema, vai diminuir com o tempo.

 

— Concordo, o tempo cura muitas feridas. — Yangchen disse. — Tenho certeza quando estiver pronto, você pode voltar-

 

— Não posso! — Jujinta urrou. — Qual parte vocês não entenderam?

 

Eles cutucaram demais. Jujinta nunca gritava, muito menos com o Avatar. 

 

— Não posso só declarar que as coisas estão resolvidas. — Ele falou. — Se algo acontece e é sua culpa, então a culpa é sempre sua!

 

O sulco em sua sobrancelha fez a cicatriz de seu nariz se aprofundar.

 

— Você! — Ele disse para Kavik, transbordando ressentimento. — Só pulando de volta na vida do time sem nenhuma preocupação. Sei que acha que pode usar suas palavras em qualquer situação mas não pode. Você não pode falar uma nova realidade e criá-la no mundo só porque ela o agrada.

 

Ele se virou para Yangchen.

 

— E, com todo o respeito Avatar, você é bem-vinda em qualquer lugar no mundo. Você não sabe como é ser desligada de suas raízes.

 

A cara de Yangchen ficou pálida. Jujinta não sabia que ela havia sido exilada do Templo do Ar do Norte. Nem sabia que Kavik não estava seguro em Bin-Er ou em Agna Qel’a. Ele jogou suas facas sem ver e pegou os dois bem no centro. Uma manobra de artista profissional.

 

Ninguém falou nada. E pensar que os três conseguiriam se unir com suas circunstâncias similares, caso a verdade não fosse um abismo impossível de atravessar.

 

Nujian grunhiu, acabando com a conversa para alertá-los de uma revoada de pássaros do mar que se aproximavam. Fraganídeos[1]. Os pássaros cinzas cortavam os ventos como a ponta de um cata-vento. A grande maioria levava peixes pequenos em seus bicos.

 

[1] Mistura entre duas aves marinhas. A Fragata e o Esternídeo. Em inglês “Frigate” e “Terns”, formando “Frigaterns”.

 

Isso significava que seus ninhos estavam perto. O palpite do Avatar estava certo, em algum lugar à frente tinha uma ilha. Eles poderiam comemorar.

 

O tamanho ameaçador de Nujian criou um frenesi de grasnadas dos fraganídeos.

 

— Deveríamos ter apostado. — Jujinta falou por cima do barulho.

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Capítulo 22