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O Legado de Yangchen: Luto

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Antes da separação, moer a farinha, varrer o chão, dizia o ditado. Após a separação, moer a farinha, varrer o chão.

 

Yangchen olhou para cima, na direção do salão de convenções de Taku, a ponta aguda de sua torre, o céu azul além. O trabalho esperaria por você, não importa o rasgo desgastado em seu espírito. O trabalho seria um amante em sua cama enquanto você chorava, sempre presente e constante, embalando você quando acordasse banhado em seu suor, incerto de quanto tempo havia perdido a consciência. Você ainda me tem. Você sempre me terá.

 

As obrigações ainda estariam lá enquanto você perdesse peso, se assustasse com a nitidez de suas costelas, estariam lá para lembrá-lo de que você precisava comer, mesmo que apenas o mínimo para manter seu corpo se movendo para frente. Você não pode me servir se não tiver sua força.

 

Yangchen já havia nadado nas marés do luto antes. Não importava quanto você implorasse por alívio. Não importava quão abertamente você mostrasse sua fraqueza. O mundo, o trabalho, arrancaria sua dívida da sua pele, rasgando longas tiras sangrentas. Ele te prenderia com varas como um fantoche e te forçaria a continuar os movimentos. Enquanto sua silhueta fosse visível contra a luz, então era bom o suficiente.

 

Você fez isso tão bem antes com Jetsun, disse a voz, todas as vozes, a voz coletiva. Você pode fazer isso duas vezes? Não aceitaremos um não como resposta.

 

Ela empurrou as portas do salão e entrou. Entrar não era mais uma cerimônia. Caminhar pelo corredor, a exaustão em seus passos, fazia com que se sentisse como metade de um terrível casamento, o valor do contrato mais importante do que qualquer um de seus participantes. Os zongdus sentavam-se à mesa, cada um perdido em seu próprio preâmbulo. Iwashi apoiava suas órbitas oculares contra seus punhos, ainda de ressaca de suas perdas financeiras. Quanto antes a convocação terminasse para ele, melhor. Chaisee folheava rapidamente página após página de anotações, todas as eras no tempo iguais para ela.

 

Ashoona observava um fino gotejar de chá medicinal cair de um coador de prata em sua xícara. — Onde está seu companheiro? — ele chamou.

 

Yangchen parou no centro do salão. A piscada que ela deu foi lenta, longa. Sua mão havia se deslocado para seu estômago. Ela teve que abaixá-la para o lado novamente, de forma deliberada.

 

Ele quer dizer Kavik. “Ka—”

 

O mundo, já lento, congelou ao redor dela. Se ela tivesse que escolher um momento em sua vida que melhor exemplificasse a falta de misericórdia que recebia como a Avatar, seria agora. Erros simplesmente não eram permitidos.

 

Iwashi olhou para ela, o único a fazer isso. — Lio… não vai se juntar a nós hoje — disse ela. Evite uma catástrofe, e nós lhe concederemos uma recompensa tão duradoura quanto uma gota de orvalho da manhã.

 

— Ele está reconciliando algumas discrepâncias em nossos livros. Nada sério.

 

— Pode ser difícil acompanhar uma entrada súbita de dinheiro — disse Chaisee, enquanto lambia seu polegar e virava outra página. — A quantidade de dinheiro que você tirou de Iwashi sobrecarregaria qualquer contador individual.

 

Iwashi lançou olhares assassinos para sua vizinha de assento, o tropeço de Yangchen esquecido. Essa era a coisa engraçada sobre provocar, não era? Estava tudo bem até doer.

 

Ashoona esperou que Yangchen terminasse sua caminhada e se arrastasse até sua cadeira. Ele servia como a barreira sorridente e desavisada entre ela e Chaisee, bloqueando a linha de visão uma da outra como as árvores de uma fileira de pomar.

 

Yangchen podia se inclinar para frente ou para trás um pouco e dar uma boa olhada na pessoa que a havia rasgado ao meio e então pela metade novamente, que havia transformado uma ilha de pessoas em escória para chegar ao minério.

 

— A agenda de hoje está leve de negócios — disse Ashoona. — Temos que nos preparar para a ratificação.

 

Chaisee se inclinou sobre a mesa, a primeira a quebrar o selo. — É quando o Rei da Terra, o Senhor do Fogo e o Chefe da Tribo da Água chegarão. — Ela fez uma longa pausa, na iminência do conhecimento. — Para dar seu selo de aprovação ao nosso trabalho.

 

— Claro — disse Yangchen, de forma vazia.

 

Já que esta era a primeira convocação da Avatar, Chaisee insistiu em explicar os detalhes, mesmo que Yangchen, como uma aluna diligente, já tivesse lido sobre eles. Logo, os primeiros detalhes de segurança chegariam, guarda-costas avançados da Tribo da Água, do Reino da Terra e da Nação do Fogo. Guardas de Brocado do Depósito de Pohuai, a elite do palácio do Senhor do Fogo, possivelmente até as temidas Garras Finas do Norte. O clima na cidade mudaria consideravelmente. Taku ia ter tantas pessoas perigosas e vigilantes que até um alfinete caído seria um objeto muito afiado e rápido para passar sem escrutínio.

 

Somente uma vez que a cidade tivesse sido considerada segura é que os chefes de estado pisariam dentro dela. As tensões do Caso Platinum não haviam diminuído nem um pouco. Governantes não apareciam simplesmente do nada, explicou Chaisee.

 

— Eu estava me perguntando — murmurou Yangchen.

 

Dada a péssima atual relação entre o Chefe Oyaluk, o Senhor do Fogo Gonryu e o Rei da Terra Feishan, eles fariam pouco em Taku além de estampar seus selos oficiais nas políticas que os zongdus haviam elaborado e partir. Então o ciclo de negócios e shangs e bens e comércio continuaria. De agora até sempre mais. Na saúde e na doença.

 

— Realisticamente, isso deixa esta tarde como a última sessão que temos para fazer quaisquer mudanças substanciais de política — disse Chaisee a Yangchen. — O que você acha? — Sua maneira era relaxada, amigável. — Esses eventos fazem sentido?

 

Fazia. Toda a explicação havia sido um longo lembrete para Yangchen de que ela oficialmente estava sem tempo. A presença de Feishan disfarçado já era ruim o suficiente, mas uma vez que os detalhes de segurança chegassem a Taku, operar uma equipe se tornaria impossível. Thapa ainda estava desaparecido. Chaisee tinha corrido com sucesso contra a ampulheta.

 

Ela havia vencido. Uma Dobradora de Fogo contra nada. Um tabuleiro vazio era tudo o que a vida de Nujian somava.

 

— O que eu faço? — perguntou Yangchen, seus pensamentos presos. Chaisee havia descrito procissões de entrada separadas para o líder de cada nação, pretendendo-as como uma ameaça — veja como Oyaluk e os outros estarão vulneráveis na rua aberta — mas, em sua cabeça, Yangchen não conseguia escapar do amor de seu bisão por desfiles, como ele saltaria feliz pelas ruas. — Saio pelo portão e depois volto?

 

A explosão de risadas veio de todas as direções no salão, martelando em seus ouvidos como pregos. Yangchen se esqueceu de si mesma, esqueceu seu entorno, só podia ouvir pessoas rindo de sua perda, e de repente ela tinha seis anos novamente, prestes a reagir da maneira como crianças reagem, só que ela era o ser mais poderoso entre as Quatro Nações e a única pessoa que poderia fazê-la se acalmar também havia ido embora, o que era uma pena porque quando o Mestre dos Elementos perdia o controle, o mundo inteiro de repente se tornava muito arrependido e falava sério —

 

— Avatar Yangchen!

 

Ela voltou a si, meio levantada de sua cadeira. Uma falha em sua percepção como papel cortado com tesoura, o desenho impresso combinando desde que ela permanecesse perfeitamente imóvel. Piscando, ela olhou ao redor.

 

A assembleia ainda estava presente. Não soprada por um vento de força gale, nem mesmo desarrumada. Ela só podia assumir, pelos risos que diminuíam ao redor dela, que ela não havia perdido tempo. Ainda presa na mesma piada. Ela interpretou seus movimentos como se precisasse alisar suas vestes sob ela e sentou-se novamente.

 

O grito veio do fim do salão. — Desculpas — disse uma jovem, uma das assistentes de Iwashi que olhava nervosamente para o mensageiro parado pela porta entreaberta. — Você tem uma mensagem.

 

Yangchen mal podia culpá-la por estar nervosa; Jujinta poderia intimidar sem dizer uma palavra. Ele pressionou um envelope nas mãos da mulher e escorregou de volta para a rua. A serva, não querendo ser o centro das atenções mais do que precisava, correu pelo corredor e entregou a nota selada a Yangchen.

 

A cera se partiu com um estalar de sua unha. Yangchen leu as poucas linhas rabiscadas no papel e o dobrou rapidamente.

 

— Há um problema? — perguntou Chaisee. — Não são más notícias sobre o Mestre Lio, espero.

 

Ela enviou a carta de sua equipe para o ar, onde ela se consumiu em uma explosão de chama. Membros da assembleia gasparam de surpresa, mas Chaisee, que havia visto ela descartar uma mensagem antes dessa maneira, assistiu os pedaços de cinza caírem ao chão com nada mais do que uma expressão de interesse leve.

 

Yangchen afundou ao lado de sua cadeira, apoiada pelo braço, e cobriu os olhos com os dedos. Sua respiração veio mais difícil, mais alta. Ela sabia que seu rosto estava avermelhando.

 

— Eu…

 

O calor viajou de seu peito para sua pele. Ao longo de seu couro cabeludo e têmporas, o suor começou a brotar, as áreas raspadas uma tela exposta.

 

— Eu… — Ela tentou novamente. — Eu…

 

— Tem trabalhado demais — disse Chaisee. Ela bateu os joelhos e se levantou. — Todos nós temos trabalhado demais. Gostaria de convocar um recesso matinal. Para toda a assembleia.

 

— Desculpe? — Ashoona estava confuso com sua mudança súbita de atitude.

 

— Podemos continuar à tarde — disse Chaisee, resoluta. — Todos, façam uma pausa e deixem o salão. Vão ver seus amigos e famílias. Nos tornamos tão focados nos negócios que muitas vezes perdemos de vista o que é realmente importante.

 

Um momento para descansar e se recompor. A única fonte de misericórdia de Yangchen era sua inimiga.

 

Iwashi foi o primeiro a aceitar a oferta de Chaisee, não querendo mais ter nada a ver com sua companhia atual. Ele deixou seu assento e saiu da sala tão rapidamente que seus atônitos assistentes mal conseguiam acompanhá-lo. Com um aceno, Chaisee enviou seus seguidores atrás deles.

 

A represa se rompeu — um precedente havia sido estabelecido. Yangchen observou a assembleia arrastar suas cadeiras pelo chão e sair do prédio, alguns deles incertos sobre o que fazer com seu tempo livre recém-concedido.

 

Ashoona olhou de um lado para o outro entre a Avatar e a Zongdu de Jonduri, sentindo a tensão no ar. Mas no final, ele seguiu seus instintos de comerciante. Prosseguir com o assunto não valia o esforço. — Amigos — disse o homem idoso com uma reverência antes de sair do salão com os membros restantes de seu séquito.

 

Uma vez esvaziado, o chão estava tão pacífico quanto uma câmara de meditação.

 

— Venha — disse Chaisee a Yangchen. — Junte-se a mim lá em cima para tomar um pouco de ar fresco.

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Capítulo 27