Roku não teve a chance de falar com Sozin até o início da manhã seguinte, quando Kozaru e Dal foram na frente para preparar a viagem de volta à capital. Ele encontrou o Príncipe Herdeiro sentado no topo do telhado da cabana onde ele estava se recuperando, olhando para a aldeia e o vale além. Roku usou sua dobra de ar para pular a subida, mas escorregou no telhado de palha ao pousar. Sozin o segurou pelo braço para evitar a queda, e eles sorriram da mesma forma.
— Preciso praticar mais — disse Roku, soltando o braço e encontrando o equilíbrio. Ele se sentou ao lado do amigo, apoiando os cotovelos nos joelhos enquanto Sozin se reclinava com as mãos para trás.
— Esta ilha é linda sem toda aquela neblina — disse Sozin.
— Pena que é tão difícil de alcançar.
O céu da madrugada estava listrado de lavanda e dourado acima dos terraços de colheita pela metade. Abaixo deles, os aldeões já estavam trabalhando duro na reconstrução e reparação, ajudados pelos outros Nômades do Ar que a Irmã Disha havia trazido. Dobras de água irrigavam o arroz. Dobras de fogo acendiam os fogos de cozinha. Dobras de terra moviam as pedras que os guardas da companhia haviam usado para destruir a aldeia. As pedras muito pesadas ou muito enraizadas na terra para serem movidas foram aceitas como características permanentes da paisagem e integradas aos novos designs.
Tirando o que aconteceu na caverna, a última vez que Roku e Sozin estiveram juntos foi na manhã em que Roku voou do Templo Real em Amra com a Irmã Disha para começar seu treinamento no Templo do Ar do Sul. Fazia apenas alguns meses, mas parecia que anos já tinham passado.
— Quer saber? — disse Sozin eventualmente, sem contexto.
— Sobre o quê? — perguntou Roku.
— Sobre o quanto eu sabia quando pedi para você vir aqui lidar com o Reino da Terra.
— Claro — disse Roku, surpreso, mas grato por Sozin ter trazido o assunto por conta própria. — Quanto você sabia quando pediu para eu vir aqui lidar com o Reino da Terra?
— Mais do que deixei transparecer — confessou Sozin. — Eu descobri sobre uma ilha coberta de neblina onde dobradores podiam treinar para aumentar a força de suas dobras. Vim aqui com Kozaru e Dal para verificar e encontramos Dobradores de Terra, não uma patrulha qualquer. Eu sabia que, se tentasse fazer com que eles saíssem sozinho, poderia se transformar em algo maior.
— Com seu pai ou com o Reino da Terra?
Sozin sorriu.
— Ambos.
A honestidade de Sozin desarmou Roku. Ele esperava ter uma séria confrontação com Sozin, na qual precisaria encurralá-lo para extrair a verdade. Mas ali estava seu amigo, colocando tudo às claras e parecendo genuinamente arrependido. Ele decidiu não perguntar sobre os dois guardas Dobradores de Terra que desapareceram antes de Malaya encontrar o grupo deles.
— Ta Min sabia de alguma coisa? — perguntou Roku.
— Não — disse Sozin, balançando a cabeça enfaticamente. — Ela sabia apenas o que eu disse para ela te contar. — Roku esperava que isso fosse verdade. — E de nada, a propósito.
— Pelo quê?
— Por enviar Ta Min para entregar a mensagem. Achei que era a única maneira de você finalmente falar com ela. Só não esqueça de me convidar para o casamento.
Roku riu e balançou a cabeça.
— Enfim — continuou Sozin —, só mais tarde descobri que o aprimoramento de dobra era limitado ao espaço da caverna e que havia nativos sedentos de sangue prontos para matar todos os intrusos. Assim que descobri, corri para cá o mais rápido que pude.
— Não os chame assim — disse Roku.
— Chamar quem de quê? — perguntou Sozin, genuinamente sem saber o que havia dito.
Roku pensou em Malaya. O que ela fez por ele, por seu clã, pelo mundo. O que ela sacrificou. Ele teve a chance de conhecê-la apenas uma vez, mas ela teve a coragem de questionar seu chefe e tentar fazer o que achava certo. Não havia pessoas suficientes no mundo como ela.
— Eles são o Clã Lambak — disse ele, sombriamente. — Eles só querem viver em paz como o resto de nós. Não são mais sedentos de sangue do que qualquer outro grupo de pessoas.
Sozin levantou as mãos, palmas para fora.
— Eu não quis dizer nada com isso.
— Então, como você descobriu a verdade? — perguntou Roku, deixando-o escapar.
— Você não vai acreditar, mas na Biblioteca Espiritual.
Os olhos de Roku se arregalaram. Ele sabia o quanto Sozin queria encontrá-la, apesar da insistência de Yasu de que era tudo inventado.
— Sério? É real?
Sozin sorriu.
— Sério. E é.
— Você deve ter estado no paraíso. O que mais você aprendeu enquanto estava lá?
— Não muito. Tive que sair bem rápido depois que percebi precisar ir te salvar.
— Sorte a minha — disse Roku.
— Nem me diga.
Eles ficaram em silêncio. O canto dos pássaros flutuava das árvores. Um bisão voador passou raspando acima, carregando vários jarros enormes de água, seguido por um bando de moscas do brilho. Um raio de sol surgiu sobre as colinas orientais, abrindo o dia e enchendo o vale com um suave brilho dourado.
— Sinto muito por ter mentido — disse Sozin. — E por tentar tirar vantagem de você.
Roku assentiu. Não era agradável perceber que estava errado sobre seu amigo mais próximo, mas ele apreciava a admissão.
— Não há nada que eu possa fazer para você me perdoar?
Roku pensou por vários momentos. Ele nunca considerou o perdão como uma questão de transação. Perdoar era deixar algo ir que poderia, de outra forma, cortar um relacionamento estabelecido. Ele queria reparar sua amizade com Sozin, mas precisava pensar além de si mesmo. Ele era o Avatar agora, e ali estava uma oportunidade que poderia aproveitar para os outros.
— Duas coisas — disse Roku, levantando dois dedos.
Sozin sorriu, divertido com a especificidade mercenária da resposta de Roku.
— Quais?
— Primeiro, eu sei que o Senhor do Fogo Taiso tem pressionado para que todas as ilhas exteriores fiquem sob controle total da Nação do Fogo, mas deixe o Clã Lambak continuar vivendo como sempre viveram. Deixe-os permanecer independentes.
Isso não era mais sobre manter o poder da ilha em segredo. Ele destruiu a Caverna Sagrada, e a Irmã Disha confirmou que não havia mais energia espiritual excessiva. Os espíritos da caverna se foram, e como Ulo nunca passou os detalhes do ritual do equinócio para ninguém, eles nunca retornariam.
— Viver como sempre viveram, é? — ponderou Sozin. — Até mesmo a parte de matar intrusos?
— Ah. Não… essa parte não.
— Humm. Mesmo se eu quisesse fazer isso por você, Roku, como poderia acontecer? Eu ainda não sou o Senhor do Fogo.
Roku deu de ombros.
— Convença seu pai a declarar esta área como vulnerável para proteger os macacos-porcos selvagens ou os gorilas-társios. Ou outra coisa. Não sei. Mas sei que você pode fazer qualquer coisa que quiser.
— Verdade — disse Sozin. — Vou encontrar um jeito.
— Obrigado.
— E a segunda coisa que você exige pela minha penitência, Avatar Roku? — perguntou Sozin com um tom sarcasticamente formal e uma reverência sentada de brincadeira.
— Se mais pessoas pensassem como os Nômades do Ar, talvez pudéssemos caminhar em direção à paz verdadeira — disse Roku, ecoando o que Gyatso havia dito. — O que o mundo tem agora parece mais uma longa pausa entre guerras, não parece? Sem conflitos abertos entre as Quatro Nações, tanto progresso foi feito. Mas também me pergunto que tipo de arsenais estão sendo construídos a portas fechadas. — Seus olhos se voltaram para o pico mais alto à distância. — É como se estivéssemos na base de um vulcão adormecido.
Sozin arqueou uma sobrancelha.
— O que exatamente você está propondo?
— Deixe os Dobradores de Ar abrirem um templo na capital. Um lugar onde eles possam ensinar sua filosofia para outros. Se der certo, talvez possam abrir mais templos nas outras nações.
— Seu novo amiguinho te convenceu a isso? — perguntou Sozin.
E embora Sozin estivesse brincando, Roku sentiu um toque de ciúmes em suas palavras.
Roku deu de ombros. Não era exatamente ideia de Gyatso, mas ela foi inspirada pelo que o Nômade do Ar disse que Yama sempre quis fazer.
— Se eu ajudar a realizar essas duas coisas, então estamos bem?
Roku assentiu. Então ele estreitou os olhos.
— Pelo menos até a próxima vez que você mentir para mim.
Sozin explodiu em risadas e passou o braço sobre os ombros de Roku. Roku o empurrou de brincadeira, fazendo-o se contorcer de dor e segurar o estômago.
— Você está bem? — disse Roku.
— Ah, estou bem. Ainda me recuperando, só isso.
Roku assentiu, imaginando se Sozin sofreu uma lesão mais séria do que estava disposto a admitir.
— De qualquer forma — disse Sozin, seu tom ficando sério. — Yasu estaria orgulhoso de você.
— Você acha?
— Sei que sim.
Por mais agradável que fosse estar com seu amigo novamente e ter superado o conflito com a relação intacta, não havia como negar que algo entre eles havia mudado.
Roku era uma pessoa diferente agora. Ou, melhor, ele havia se aproximado mais de se tornar seu verdadeiro eu. Quem sabe o que Sozin havia passado. Eles ainda se encaixavam bem o suficiente por enquanto, mas talvez chegasse um dia em que não se encaixariam mais. Talvez fosse em alguns anos. Talvez algumas décadas. Esta noção havia passado por sua mente várias vezes desde que foi identificado como o Avatar, mas Roku finalmente acreditava que não precisava mais de Sozin da mesma maneira que precisava antes.
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