Ulo acordou antes do amanhecer. O chefe do clã, acreditando que Roku ainda estivesse dormindo, saiu silenciosamente da cabana e começou a falar com alguém lá embaixo em sussurros. Ele falava baixo demais para que Roku conseguisse entender qualquer coisa. Alguns minutos depois, a conversa terminou, passos se afastaram, e então Ulo subiu novamente a escada, carregando uma cabaça cheia de água.
— Está tudo bem? — Roku perguntou ao se sentar, fingindo que o barulho acabara de acordá-lo.
Ulo assentiu.
— Todos estão empolgados, só isso. Hoje é um grande dia.
Ele se dirigiu ao canto do espaço de convivência e acendeu as brasas. Derramou água da cabaça em um pote e depois se afastou.
— Como você está se sentindo?
— Melhor. — Roku tossiu algumas vezes. — Mas ainda não estou com toda a minha energia — ele mentiu.
— Com o tempo. — Ulo assentiu e foi até a janela enquanto a água esquentava. — Se alguém deve apreciar o equinócio, é o Avatar, não é? Um dia de perfeito equilíbrio entre luz e escuridão. Um ponto de apoio, como você.
— Sempre preferi o solstício de verão — Roku disse. — Mas você tem um bom argumento.
Quando a água começou a ferver, Ulo preparou as folhas secas de sampaguita que floresciam à noite. Ele encheu uma xícara usando sua dobra de água, deixou as folhas em infusão, então entregou-a a Roku. Roku se sentou, abaixou a cabeça ao aceitar, levantou a xícara aos lábios – então hesitou.
Ulo sempre insistia para que Roku tomasse o chá, mas Roku já tinha visto Ulo beber ele mesmo?
Roku achava que não.
Então se lembrou da descrição de Malaya sobre a aranha fantasma e como ela paralisava sua presa. Talvez a energia baixa prolongada de Roku não fosse apenas um efeito colateral de entrar na Caverna Sagrada sem treinamento. Talvez houvesse algo no chá retardando sua recuperação.
Ele fingiu beber, então abaixou a xícara e suspirou de satisfação.
— Delicioso.
Ulo sorriu.
— Não é mesmo?
Roku assentiu. Fingiu outro gole.
— O que devo esperar quando encontrarmos Yungib?
Ulo acariciou a barba.
— O espírito da caverna aparecerá quando o sol estiver diretamente acima, visível através da fenda no teto. Então começaremos o ritual.
“O sacrifício”, Roku pensou, se Malaya estivesse correta.
— Algo que eu precise fazer?
— Feche os olhos, concentre-se e centralize-se. Sua energia será avassaladora. Ainda mais do que quando você entrou na caverna.
— Certo, meditar. Simples assim.
— E enquanto eu estiver realizando o ritual, não tente usar sua dobra sob nenhuma circunstância. Nem mesmo uma faísca. Os resultados poderiam ser catastróficos. Imagino que você tenha conseguido sobreviver sem treinamento antes porque você é o Avatar. Mas na presença do espírito da caverna, isso pode não ser suficiente.
Olhos fechados. Sem dobra. Isso não parecia suspeito nem um pouco.
— Entendi. E depois? Depois que você fizer sua parte, você me dirá quando é seguro abrir os olhos, e eu falarei com o espírito?
Ulo balançou a cabeça.
— Meditaremos, e será mais como uma comunhão. Talvez um pouco como entrar no Mundo Espiritual, o que tenho certeza que você conhece bem como Avatar.
Roku fingiu tomar outro gole de chá.
— Claro.
— Quando o sol se mover e sua luz se afastar do centro da Caverna Sagrada, nosso tempo com Yungib chegará ao fim, e o espírito da caverna partirá, deixando energia suficiente para nossos dobradores até o próximo equinócio.
— E o que acontece se você não completar o ritual? — Roku perguntou. — Sem poder extra de dobra por meio ano?
Ulo assentiu, então voltou para a entrada da frente da cabana. O sol estava nascendo, iluminando o céu oriental além do vale. Roku aproveitou sua distração e esvaziou sua xícara na entrada dos fundos.
Ulo se virou um momento depois.
— Então, de fato um grande dia. Limpe-se, tome café da manhã e aproveite as festividades da manhã. Cuidarei de alguns preparativos finais, depois, quando eu voltar, você e eu iremos para a Caverna Sagrada.
Roku fingiu um sorriso.
— Mal posso esperar.
Comentar