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A Aurora de Yangchen: Lendo Folhas de Chá

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— Peça algo ou saia.

 

Kavik abriu os olhos e viu um velho rude, com a forma de um barril, de pé sobre ele. Ele bateu o prato de bambu que estava secando para enfatizar seu descontentamento de que um cliente em potencial entrou e saiu sem gastar nada.

 

Eles se encararam. Kavik iria sair, porém da maneira mais lenta e irritante possível. Ele estava de mau humor.

 

— Desculpe, desculpe, — Disse uma voz à beira da familiaridade. — Ele estava esperando por mim.

 

Uma figura deslizou para o assento à frente dele. Ela vestia roupas simples de inverno do Reino da Terra, feitas de algodão acolchoado, provavelmente para evitar as peles da Tribo da Água ou da Nação do Fogo. Seu cabelo, no entanto, estava cuidadosamente penteado em um par de coques de classe alta.  Uma franja grossa e impenetrável descia de sua testa até suas sobrancelhas.

 

Esta era a segunda vez que ele dividia a mesa com o Avatar e ainda quase foi enganado.

 

— A praça está completamente bloqueada. — Ela explicou a Kavik, com falta de ar — Eu tive que dar a volta em tudo. Eu espero que você não esteja chateado comigo.

 

— É claro que ele não está, querida. — disse o proprietário, de repente cheio de sorrisos. — Por favor, leve o tempo que precisar. O menu está no quadro de lousa.

 

Kavik franziu a testa para o velho. Sério? Ele não recebeu nada além de um sinal de desprezo de volta, como se sua nova companhia fosse boa demais para ele

 

Espiritualmente falando, ela era.

 

— É uma peruca. — Kavik disse para Yangchen uma vez que eles ficaram a sós.

 

— Você gostou? — Ela mexeu nos coques debochadamente com suas mãos enluvadas. — Eu ouvi que o estilo está na moda na Nação do Fogo. Infelizmente minhas roupas não combinam, mas foi o melhor disfarce que eu consegui montar em pouco tempo.

 

Ela parecia mais atraente do que ele gostaria de admitir.

 

— É apenas um pouco menos sutil do que as tatuagens azuis gigantes.

 

— Sim, bom, eu não tenho muita escolha. Essa cidade me deu suas boas-vindas oficiais. Eu tenho tantos observadores grudados em mim agora que o Avatar Yangchen não pode dizer olá para ninguém na rua sem os Shangssaberem.

 

Hmph. Pelo contrário, a tentativa de roubo de Kavik foi a introdução dela a como as coisas funcionavam em Bin-Er.

 

— Você deu uma boa olhada no meu agente?

 

— Sim. Você não estava mentindo sobre ser independente. Aquele cara é o oposto de um jogador poderoso.  A transferência mais desleixada que eu já vi.

 

Antes de deixar a casa dele na outra noite, Yangchen, em um último golpe em seu orgulho profissional, disse a Kavik que seus dedos não tinham sido tão rápidos quanto ele pensava. Ela o viu furtar o envelope de seu quarto e colocá-lo em sua bota. Mas em vez de exigir de volta, ela o instruiu a entregá-lo para Qiu como prometido.

 

— O que havia dentro? — ele perguntou.

 

— Lixo. Eu faço versões falsas da minha correspondência de vez em quando, cada cópia diferente em uma maneira mínima, mas crítica, e as deixo serem interceptadas. Baseado em como meus oponentes reagem, eu consigo traçar as cadeias de vazamentos. Eu também queria te proteger, caso alguém ao longo do caminho se chateasse por você ter voltado de mãos vazias. Dessa forma, está tudo bem.

 

Uau. Se Kavik trabalhasse para o Avatar, ele teria uma chefe muito mais esperta e diligente do que Qiu. Mas eles não estavam bem lá ainda, estavam?

 

— Eu pensei na sua oferta. — disse ele — Eu preciso de mais detalhes. É justo me contar no que eu posso estar me metendo.

 

Ela levou um tempo para responder. Kavik a colocou intencionalmente em uma posição difícil, e justiça não tinha nada a ver com isso. Ela poderia revelar mais e arriscar que ele fugisse com o conhecimento de suas intenções ou perder o seu potencial novo recruta. A escolha era dela.

 

Depois de pensar um pouco, ela tomou sua decisão, e Kavik pôde ver a determinação fluir através de sua postura como água através de uma bomba. A garota não hesitou uma vez que decidiu o curso da ação.

 

— Eu tenho motivos para acreditar que os Shangs de Bin-Er e Jonduri estão planejando colocar suas mãos em um ativo que os daria poder ilimitado sobre as pessoas dentro de suas cidades e nas Quatro Nações como um todo. — disse Yangchen — Eu preciso de alguém para me ajudar a interceptá-lo e garantir que ele nunca veja a luz do dia.

Interessante.

 

— O que é esse ativo?

 

— Eu ainda não sei. A lógica ditaria que é um tipo de arma, mas eu estou tendo problemas para imaginar o que poderia dar a um monte de comerciantes poder suficiente e confiança para pensar que eles podem empinar seus narizes para todos os líderes do mundo. Ele cabe em caixas de transporte e pode ser enviado em um barco.

 

— Talvez sejam muitas armas? — Kavik sugeriu — Espadas suficientes para armar uma força própria?

 

— Pode ser, mas os Shangs seriam tolos em pensar que poderiam reunir mais aço do que uma única divisão do exército do Reino da Terra. Eu já passei por tantas possibilidades. Veneno, ou uma droga apotecária. Um segredo, talvez, chantagem a um chefe de estado. Um pequeno e compacto tesouro de imenso valor? Eu sei que o Chefe Oyaluk está obcecado em recuperar o amuleto dinástico perdido da sua família e daria quase tudo para obtê-lo de volta.

 

Yangchen esfregou os olhos. Parecia que as perguntas lhe tiraram o sono.

 

— Eles chamam isso de Unanimidade. — disse ela — Isso é tudo o que eu tenho.

 

Muito, muito interessante.

 

— Eu suponho que não há evidências suficientes para envolver os governantes das Quatro Nações.

 

— Eu não quero nenhum deles envolvido — disse ela — Se a Unanimidade é tão poderosa quanto os Shangs acreditam, então poderia virar o mundo a favor de quem a possui. Eu gostaria de descobrir o que é esse ativo, e em seguida me livrar dele. Silenciosamente.

 

Uma onda de gritos do lado de fora virou suas cabeças. Um grupo de pessoas a caminho da praça, levantando suas vozes cedo. O feitiço de curiosidade que ela lançou sobre Kavik quebrou.

 

— Isso é bizarro. — disse ele, balançando a cabeça — Você é o Avatar, e está tramando esquemas em uma casa de chá escura. Por que você não está lá fora, mantendo a paz?

 

— Mantendo a paz? — Houve uma vibração no ar — O que você acredita que implica manter a paz? Você é da opinião de que eu deveria voar sobre a praça e dizer aos famintos e pobres de Bin-Er que eles deveriam se calar e ir para casa?

 

—  Eu não quis dizer isso.

 

— Você quis até eu te repreender — Ela caiu em seu banco, taciturna, aparentando sua idade pela primeira vez, a mesma que de Kavik. — Eu tentei conversar com as pessoas que poderiam fazer uma diferença real, e elas cuspiram na minha cara. Os Shangs vão continuar a governar cruelmente as pessoas dessa cidade a menos que eu possa negá-los o poder da Unanimidade. Eu imagino que você já tenha ouvido o ditado da dominação de água: O peso de uma pena move a carga de uma carroça.

 

Ele já tinha. Um clássico ensinamento para focar em redirecionar a força em vez de revidar de modo bruto. Movimentos sutis para efeito máximo.

 

— Esse esquema, como você chamou, é onde eu aplico a pena — disse Yangchen — Se eu puder mesmo controlar isso.

 

Ela esfregou os olhos novamente, e quando as pontas de seus dedos voltaram, elas estavam úmidas.

 

— Eu estou cansada.

 

Uma coisa normal de se dizer, mas ela fez parecer como uma grave confissão de um crime imperdoável.

 

— Eu estou muito cansada de lutar essa batalha de novo e de novo.

 

O proprietário saiu dos fundos, carregando uma chaleira fumegante. Ele jogou-a sobre a mesa, seguida por dois copos grandes, preenchidos com pérolas de chá seco, embora eles ainda não tivessem pedido nada.

 

— Aqui, querida — ele disse para a Yangchen disfarçada — O nosso melhor, por conta da casa. Você parece precisar.

 

Kavik gaguejou sobre o princípio da coisa. Nenhum lojista em Bin-Er dava coisas para clientes normais. O velho não sabia que ela era o Avatar. Ela nem ao menos estava com suas roupas de Nômade do Ar.

 

— Obrigada, tio. — disse Yangchen.

 

Ela pegou o recipiente e serviu.

 

Com o chá embebido, ela encontrou uma reserva oculta de energia para conversar com o proprietário sobre Bin-Er e como, aos seus olhos, ela deve ter mudado ao longo dos anos. Falar cara a cara parecia ser o seu estilo com as pessoas, independentemente de elas saberem que ela era o Avatar. O homem ansiosamente compartilhou suas opiniões com uma ouvinte atenta. Quando ele terminou, Yangchen era quase sua herdeira legal.

 

— Você — o proprietário disse para Kavik — Trate uma garota legal como ela bem, ouviu? — Ele lançou um olhar final de advertência e foi cuidar do fogão.

 

Kavik observou as folhas se desenrolarem em sua xícara.

 

— Esse trabalho vai ser perigoso? — ele perguntou. Ele sabia a resposta, mas haviam rituais.  Declarações insignificantes entendidas como diligência prévia.

 

— O que você acha? — ela não segurou sua bufada. — Vai deixar pessoas poderosas com muita raiva. Engraçado como estamos falando sobre isso, não? Nós temos a nós mesmos para culpar se algo de ruim acontecer, eles não. — Pelo menos ela estava sendo honesta.

 

— Eu tenho um preço — disse Kavik.

 

— Eu imagino que tenha. Diga.

 

O pedido veio tão fácil, como se fosse uma retaliação contra seu irmão desaparecido. Depois da revelação de Qiu, não havia mais vínculos dele e seus pais à Bin-Er.

 

— Eu quero passes para fora da cidade, para mim e para minha família. Passes reais. Eu os quero tão limpos que você poderia comê-los.

 

Ela não respondeu.

 

— Como o Avatar você pode consegui-los, não pode?

 

— Eu posso. É só que… — ela mordeu o lábio — Seus pais mesmo disseram. O escritório de controle de Bin-Er é uma das instituições mais corruptas e indiscretas do continente. Se eu colocar seus nomes no processo, será um sinal de fogueira para os Shangs de que você está trabalhando para mim, e você se tornaria inútil como espião. Eu não poderia obter os passes até você completar a missão.

 

Ele podia adivinhar porque ela estava desconfortável.

 

— Você não gosta de como isso faz você se sentir — disse Kavik — Você gostaria de mostrar um ato de generosidade primeiro e depois me ter lhe servindo por um senso de obrigação. À bondade do meu coração.

 

As emoções por trás dos presentes eram complicadas, Kavik sabia bem.

 

— Mas se formos nesta ordem, você está retendo o pagamento até eu terminar de prestar o serviço. Torna mais óbvio que você está simplesmente me usando para conseguir o que você quer.

 

A expressão mediana que ele ouvia ser usada era “agulha apontando para o céu”, referindo-se a uma balança em que até os grãos de poeira haviam sido equilibrados. Uma transação perfeitamente recíproca. Uma ideia estrangeira e abominável para uma criança da tribo da água que foi criada para compartilhar sem contar e para dar a todos que conhecesse o que precisassem sem exigir nada em troca.

 

— Bem-vinda a Bin-Er. — Kavik murmurou — Você tem alguma outra opção?

 

Yangchen suspirou.

 

— Eu não tenho. Eu preciso de um agente em Jonduri imediatamente.

 

O delicado jasmim tinha terminado de imergir. Kavik pegou sua xícara e levou um momento para considerar o líquido âmbar. Chá servido pela própria Avatar. Nobres podiam passar a vida inteira sem nunca receber tal honra.

 

— Então eu acho que você vai ter que confiar em mim.

 

Antes que ele pudesse beber, um aperto de ferro fechou em torno de seu pulso. Gotas de chá respingaram na mesa. Yangchen inclinou-se para a frente, um fio de mola.

 

— Antes de tornarmos isso oficial, me diga. O dinheiro que eu te dei. Você entregou para quem? Eu vi você transferir as moedas para alguém enquanto eu estava te seguindo por cima, mas eu não consegui distingui-lo.

 

Ele tinha uma ideia do que ela estava fazendo.

 

— Eu entreguei para…

 

Yangchen assomou seu rosto perigosamente perto dele até que estivessem respirando o mesmo ar.

 

— Me olhe nos olhos enquanto responde — disse ela — Não pisque.

 

Kavik olhou para íris tão cinzentas quanto nuvens de tempestade antes de um terrível aguaceiro.

 

— Eu entreguei o dinheiro para uma mulher chamada Ayunerak que vive aqui desde antes do Acordo Platina. Ela comanda uma cozinha que alimenta os que passam fome. Ela fará bom uso do dinheiro.

 

O Avatar inclinou a cabeça para trás e para frente, tentando vê-lo em ângulos sutilmente diferentes.

 

— Tudo bem. Tudo bem. Pontos a seu favor. Agora me diga. Você está trabalhando para um Shang? Você é um espião?

 

— Como eu poderia ser um espião? — ow!

 

Os dedos dela se apertaram. Ela era mais forte do que aparentava.

 

— Você é da minha idade — Yangchen disse — Muito bonito de olhar, se você não se importa que eu diga. Você certamente não é outro ministro ou dignitário tentando me dar ordens. Quando eu pergunto no bairro da Tribo da Água, ninguém tem nada ruim a dizer sobre você.

 

Parece mais que eles se recusaram a dizer qualquer coisa sobre ele. Seus conterrâneos tendiam a manter os negócios, bons ou ruins, para si mesmos.

 

— Nos conhecemos sob circunstâncias muito improváveis onde você conseguiu demonstrar um número de habilidades úteis para mim — disse Yangchen — Uma das quais é ser um mentiroso adepto. Eu fiz a escolha de trazê-lo. Você sabe como as melhores companhias funcionam?

 

Kavik sabia.

 

— Fazendo o alvo sentir que está no controle. Você acha que existe uma chance de que isso tenha sido um grande estratagema para ganhar sua confiança.

 

— Existe um ditado de Pai Sho: Uma boa jogada para você é uma boa jogada para o seu oponente. Agora responda à pergunta. Você está trabalhando para um Shang? Você está trabalhando para Zongdu Hense?

 

— Não — disse Kavik sem conseguir evitar um sorriso pretensioso. A franqueza era o objetivo aqui, tanto na pergunta dela quanto na resposta dele. Ela estava medindo suas reações físicas. — Eu não estou trabalhando para um Shang ou para o Zongdu ou para qualquer um dos poderes que estão em Bin-Er. Eu odeio essa cidade com todas as fibras do meu ser, e eu não quero nada mais do que deixar ela e você para trás.

 

Kavik deixou ela absorver sua declaração.

 

— Agora, se você terminou de medir meu pulso e checar se minhas pupilas estão dilatando, meu chá está esfriando.

 

Ela soltou o pulso dele. Ele e seus pais tinham feito a coisa certa em não trazer à tona Kalyaan. De jeito nenhum o Avatar lhe daria essa oportunidade se ela soubesse que seu irmão tinha sido um comandante das pessoas que ela estava tentando derrubar.

 

Yangchen o estudou um pouco mais, sentada tão perfeitamente imóvel que parecia uma estátua. Então, a contragosto ela pegou sua xícara de chá e a levantou para Kavik.

 

— Acho que isso vai ter que servir por enquanto — disse ela — À uma parceria de sucesso.

 

Ambos beberam lentamente. Observando um ao outro o tempo inteiro.

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Capítulo 15